sexta-feira, 13 de agosto de 2010

O CAMPO DA CULTURA, OS ATORES LOCAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS DE CULTURA

O CAMPO DA CULTURA, OS ATORES LOCAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS DE CULTURA1.

É necessário que o poder público consiga delimitar o que é Cultura e qual será o cenário de sua atuação enquanto agente fomentador. Para isso, o Estado precisa considerar as duas dimensões da Cultura propostas por BOTELHO: a antropológica e sociológica, distinguindo-se a cultura no plano cotidiano daquela que ocorre no circuito organizado. Esta postura permite contextualizar as características próprias de cada uma, identificar quando essas dimensões se articulam, produzindo um cenário promissor para definir políticas públicas adequadas, quais as estratégias que serão transformadas em programas, projetos e ações.

Esta é uma atitude elementar, especialmente no poder público, com seus poucos recursos financeiros dedicados ao setor, que criaram aberrações no financiamento à cultura nas últimas décadas, quando foram deixados para os departamentos de marketing a definição do que é produzível ou viável enquanto projeto, numa perspectiva unidimensional e instrumental de Cultura.

Porém, essas duas dimensões estão articuladas e tratá-las apenas isoladamente pode não gerar resultados. Para isso, dois movimentos são necessários: um, das próprias sociedades, em que o exercício real da cidadania, da participação e da organização é capaz de produzir demandas por políticas. O outro é do próprio poder público, delimitando seu universo de atuação, mas em conjunto com outras secretarias governamentais, pondo a criatividade a serviço da utopia, numa perspectiva de entender a cultura de maneira multidisciplinar.

A postura dos governos, na delimitação de sua atuação, é para melhor utilizar os escassos recursos financeiros e nem para se perder no jargão “Cultura É Tudo”. É desejável, no século XXI, diante de tanta reflexão teórica sobre Cultura, uma ação governamental que trabalhe para romper com a dicotomia erudito X popular. Entre o erudito e o popular, existem relações de troca, um processo de hibridização que precisa ser observado.

Esta postura demanda do poder público: tomar a cultura em sua diversidade, sem hierarquias, numa relação horizontal e de rede de diálogos.

É preciso entender a importância da cultura como um recurso contemporâneo, suas ligações com o desenvolvimento local, economia, tecnologia e quiçá, meio ambiente. É preciso romper a “boca torta” para a palavra gestão, ao mesmo tempo em que eu sei que Cultura é muita mais que só gestão… é do universo do simbólico.

Veja um exemplo disso: em virtude do tipo de financiamento predominante no país nas duas ultimas décadas, as dinâmicas de produção cultural passaram por diversas transformações e tensões: o abandono de artistas, produtores e comunidades inteiras a própria sorte, numa jornada por departamentos de marketing intermináveis; ao mesmo tempo, esse quadro fomentou a associação e a criação de formas de articulação entre artistas, produtores, públicos e comunidades de arte e cultura, numa atuação criativa frente aos poucos mecanismos estatais de fomento e financiamento. Como interagir com um cenário desses? Quais as perspectivas futuras? Que tipo de diálogo é possível? Quais as dinâmicas postas em funcionamento?

O espaço local é o locus privilegiado para ter a articulação dessas duas dimensões da cultura através da demanda dos grupos por direitos e da ação do aparato governamental. O poder público municipal deve ter um papel presente nesse esferal. O cenário local é de pluralidade de interesses ativos, arenas cujos atores conhecem seus interlocutores, sabendo de quem cobrar e com quem se articular. O mesmo ocorre no sentido inverso: do Estado para a Sociedade, nas várias direções possíveis das teias de relações.

O Estado deve aparecer não como dirigente, mas como articulador e fomentador. Para isso, é necessário ter em mente a importância das políticas públicas, no caso, políticas culturais adequadas, que busquem parcerias na iniciativa privada, na sociedade e nas outras instâncias governamentais.

Uma política cultural consistente exige dos seus gestores a capacidade de antecipar problemas, visão de longo prazo, planejador, ser criativo o suficiente para sugerir financiamentos alternativos para a produção cultural, entender das dinâmicas do aparato governamental, buscar entender a diversidade cultural, pensar as lógicas da contemporaneidade e como a tecnologia pode servir como ferramenta para o fomento às artes e à cultura.

Este gestor precisa entender acerca da cadeia produtiva da cultura que é formada pelos criadores e produtores; organizações culturais; empresas investidoras; poder público; imprensa cultural; meio acadêmico e público da cultura. Precisa entender sobre o tripé produção – distribuição – fruição. Isso porque as políticas públicas de cultura devem compreender o sistema em sua totalidade articulada.

É preciso insistir nisso: enquanto temos de um lado a cadeia produtiva da cultura, cada vez mais capacitada para os desafios contemporâneos, temos de outro, gestores sem sensibilidade e mesmo interesse em aprofundar políticas, em conhecer contextos, em experimentar.

No caso de Blumenau, algumas questões são urgentes para uma visão sistêmica e articulada entre as duas dimensões da cultura: mapear o consumo e os hábitos culturais dos públicos; organizar sistema municipal de indicadores culturais; romper com a lógica do evento e pensar em programas, projetos e ações com responsáveis, prazos, recursos e resultados; ampliar os recursos do Fundo Municipal de Cultura e pensar novos mecanismos de financiamento, como editais específicos para áreas; adesão ao Sistema Nacional de Cultura, espécie de SUS da Cultura; ampliar os recursos destinados a Fundação Cultural; rever o organograma administrativo da estrutura, modernizando a administração; instituir o Plano Municipal de Cultura; tornar o Conselho Municipal de Cultura órgão deliberativo e; iniciar política de implantação de Centros e Casa de cultura nas comunidades de Blumenau.

No caso da Universidade, esta pode inserir-se como agente fomentador, tal qual o Estado, mas num papel de complementaridade. Focar na capacitação dos profissionais envolvidos na cadeia produtiva da cultura, participar da produção dos indicadores culturais; identificar e analisar a cadeia produtiva da cultura em Blumenau e região; formar público fruidor de arte, cultura e humanidades, além de ser parceiro no desenvolvimento autônomo de grupos e comunidades da região.

Por fim, pergunto: Já que o poder público municipal é tão importante assim, será que Marlene, Neuza, Nico e Kleinubinho dão conta?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOTELHO, Isaura. Dimensões da Cultura e políticas Públicas.

COSTA, Leonardo Figueiredo. Uma reflexão sobre as Políticas Públicas e a Questão da Formação na Área Cultural.

DURAND, José Carlos. Cultura como objeto de Política Pública.

RUBIM, Albino. Políticas Culturais: entre o possível & impossível.

1 Márcio José Cubiak, mestrando no Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade Regional de Blumenau – FURB. Graduado em Ciências Sociais.